Profissionais presos entre a Tecnologia e a Justiça (3)
- AAmstg
- 1 de fev.
- 5 min de leitura
Atualizado: 4 de fev.
Reflexões sobre culturas jurídicas, o futuro do direito e a prática jurídica num mundo globalizado
Terceira Parte : Mas também não pode perdurar sem elas. A Justiça não pode prosperar somente com técnicas .
O conceito de técnico jurídico no contexto destas reflexões evoca um profissional cuja função se concentra no domínio técnico e processual das leis e regulamentações, mas que poderia estar desconectado da dimensão mais humana, estratégica e filosófica do direito. Este perfil tende a emergir como uma engrenagem funcional dentro de um sistema mais amplo em um ambiente saturado de legislação e instituições sobrecarregadas pela burocracia. Ainda assim, é simultaneamente limitado em sua capacidade transformadora.
Em seguida, várias perguntas podem ser feitas sobre esse perfil profissional. A primeira é se ele pode listar características específicas que o destacam.
Características do Técnico Jurídico
As quatro qualidades a seguir podem definir um técnico jurídico :
Este profissional tem domínio de habilidades normativas e processuais.
O técnico jurídico é, acima de tudo, um especialista em regulamentos, códigos e procedimentos. Sua principal habilidade está em conhecer e administrar habilmente o aparato regulatório atual, garantindo que uma estrutura legal precisa suporte cada ação ou decisão. Sua expertise lhe permite navegar facilmente entre disposições complexas, interpretar regulamentos e executar procedimentos com rigor formal. Esse conhecimento detalhado é, sem dúvida, de valor inegável. Ainda assim, muitas vezes carrega um risco: a conversão do direito em um fim em si mesmo, em vez de um meio para alcançar soluções justas e funcionais.
Implemente uma abordagem funcionalista.
Para o técnico jurídico, a aplicação de regras e processos é uma tarefa fundamentalmente instrumental. Seu objetivo é garantir que tudo seja feito "como deve ser feito" pelos ditames da lei, sem necessariamente se deter nas razões subjacentes às regras ou suas consequências no mundo real. Essa abordagem funcionalista pode ser prática para a operacionalidade do sistema, mas também pode gerar rigidezes que impedem o desenvolvimento de soluções criativas ou de ajuste a contextos específicos. Nesse sentido, o técnico jurídico pode perder de vista o papel do direito como mecanismo de geração de equilíbrio e consenso dentro da sociedade.
Dedicado ao formalismo jurídico.
Uma das tendências mais marcantes do técnico jurídico é sua inclinação para o formalismo jurídico. Sua visão é orientada para a observância estrita (muitas vezes significa "no sentido literal") dos requisitos legais, às vezes independentemente da equidade material ou da praticidade de suas soluções. Para esse perfil, a validade de um ato jurídico não reside tanto em sua Justiça ou eficácia, mas no cumprimento exato dos procedimentos estipulados. Embora essa atitude garanta certeza e segurança jurídica, também pode levar a uma aplicação rígida da lei que deixa pouco espaço para adaptabilidade a circunstâncias excepcionais ou às necessidades particulares daqueles que buscam assistência jurídica.
Apresenta evidências da despersonalização da lei
A ênfase na conformidade regulatória e no rigor processual pode levar o técnico jurídico a abordar problemas legais de forma impessoal e mecânica. Em seu desejo de garantir a correção formal de suas ações, ele pode se distanciar da dimensão humana da lei, que atende aos interesses, emoções e realidades específicas das pessoas envolvidas em um conflito ou transação. Essa tendência à despersonalização reforça uma visão burocrática da lei, onde as pessoas se tornam arquivos e os problemas legais se tornam simples questões processuais.
Todas as características são devidas a causas. As do técnico jurídico poderiam muito bem ser as seguintes:
Causas da “Tecnificação” do Direito em Ambiente Administrativo
Pode haver outros, mas destaco apenas três:
- Excesso de Legislação e Normas:
A proliferação de leis e regulamentos, muitas vezes contraditórios ou redundantes, torna o direito um emaranhado técnico que exige especialistas para navegar.
- Burocratização da justiça:
O excesso de protocolos e regras internas de organização das instituições judiciárias, enfatizando procedimentos e prazos, pode transformar a Justiça num exercício mecânico de conformidade regulatória em vez de busca de soluções justas.
- Distância entre o direito e a sociedade:
Em vez de ser uma ferramenta para resolver conflitos ou melhorar a vida da comunidade, a lei é percebida como um sistema autônomo que responde mais aos processos internos do que às necessidades das pessoas.
O conjunto de causas que condicionam o ambiente onde o técnico jurídico atua e com o qual a pessoa e o ambiente se influenciam mutuamente gera riscos que também retroalimentam o cenário autoperpetuando-se.
Riscos da Predominância do “técnico jurídico”
Novamente, pode haver outros, mas destaco apenas três:
- Redução do papel do advogado :
O profissional do direito pode ser relegado a um mero gestor de procedimentos e exigências legais, perdendo sua capacidade de influenciar decisões ou promover mudanças estruturais de forma estratégica.
- Justiça formalista e vazia:
A insistência na conformidade técnica pode levar a decisões que, embora juridicamente corretas, são percebidas como injustas ou desconectadas da realidade social.
- Estagnação e falta de inovação:
Uma abordagem técnica limita a criatividade jurídica e a capacidade de propor soluções inovadoras ou adaptadas a contextos em mudança.
Quando há uma superdimensionamento nos níveis de risco observados e o acúmulo de desacordos entre a sociedade e seu sistema de justiça, tudo isso indica a desconexão entre as instituições, os propósitos que as animaram e as consequências que são alcançadas e começam a ser percebidas como doentias. É quando é preciso sugerir uma mudança no regime de atuação. E incentivá-los a aplicar aqueles antídotos que podem redirecionar o estado de coisas. Sou cético quanto à obtenção desse resultado no curto prazo, mesmo corrigindo ao menos as distorções mais aparentes sobre os objetivos quando os desvios são superestruturais. No entanto, abaixo estão minhas ideias sobre isso em particular.
Antídotos: Advogar para ir além da Técnica
Quatro alavancas poderiam servir aos objetivos e metas:
- Recuperar a Finalidade da Justiça no Estado de Direito:
Advogados e juízes devem lembrar que a lei não é um fim, mas uma ferramenta para alcançar Justiça, equidade e paz social. Isso requer equilibrar o formalismo com uma visão humanística e estratégica.
- Promover o pensamento crítico:
Um advogado que se limita a aplicar regras não questiona as inconsistências ou injustiças do sistema. A formação jurídica deve incluir filosofia do direito, ética e sociologia em um significado mais profundo e conteúdo educacional para desenvolver uma visão mais ampla de seu papel social.
- Incorporar competências interdisciplinares:
Um "técnico jurídico" deve se transformar em um "estrategista jurídico" que combina conhecimento jurídico com economia, finanças, tecnologia e ciências sociais para entender e abordar problemas de forma abrangente.
- Promover a simplificação regulatória :
Defenda estruturas jurídicas mais transparentes e acessíveis que permitam que a lei seja compreendida e usada por todos, não apenas por especialistas técnicos.
Como resultado do conjunto de antídotos, o objetivo é manter alguma harmonia entre a tecnologia e a Justiça no sentido mais amplo.
Reflexão final: Qual o papel do Técnico Jurídico?
Um "técnico jurídico" é essencial para garantir o bom funcionamento de um sistema jurídico complexo, mas não pode ser o único modelo de advogado. Embora sua precisão e rigor sejam valiosos, o direito perde sua essência quando é reduzido exclusivamente a um exercício técnico.
Em um ambiente onde a saturação legislativa e a burocracia são a norma, o desafio é transcender a técnica e resgatar o papel do advogado como mediador entre as regras e as necessidades humanas, equilibrando a precisão técnica com a visão estratégica e o senso de Justiça. O técnico deve fazer parte da equipe, mas não pode liderar a transformação de um sistema que exige adaptação a um mundo em constante mudança.
Meu resumo sobre o tema é este: porque a sociedade rege a lei por meio de princípios de conveniência mútua e comum, nem o Estado de direito é simplesmente um conjunto de declarações ditadas do nada, nem a Justiça é meramente uma executora cega de ditames vindos desse mesmo nada.

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